Abstract
Histórico: Devido à sua microflora ocular, a espécie equina está predisposta a desenvolver úlceras micóticas que, quando não tratadas adequadamente, podem levar à formação de um abscesso estromal. O abscesso estromal ocorre pela introdução de microrganismos no estroma da córnea. Durante a reepitelização, o corpo estranho é encapsulado, criando assim uma barreira que protege as bactérias ou os fungos do tratamento com medicação antimicrobiana. Esse quadro pode acabar resultando em cegueira devido à iridociclite crônica, colocando em risco a visão do animal. O presente trabalho tem como objetivo relatar um caso de cirurgia corretiva de abscesso estromal em uma égua com a administração de fluconazol intraestromal no intraoperatório, a fim de corroborar a eficácia da técnica. Caso: Foi avaliada uma égua de 9 anos de idade, com a queixa de que seu olho direito estava fechado e "amarelado" e que já havia sido tratada com anti-inflamatório injetável intramuscular à base de flunexina meglumina (Banamine® - 50 mg) por 15 dias, referindo-se a uma possível úlcera no olho direito. A triagem oftalmológica resultou em um reflexo direto negativo e nenhuma resposta de ameaça no olho direito. O exame da conjuntiva mostrou congestão e quemose. O exame da córnea do olho direito foi negativo para os testes de Fluoresceína e Lissamina Verde, e foram observadas opacidade e neovascularização corneana. O diagnóstico final foi de um abscesso corneano de provável origem fúngica secundário a uma ceratomicose. Após a consulta, foram realizados exames complementares de sangue e bioquímicos, que apresentaram resultados normais para a espécie em questão, e o tratamento foi iniciado com colírio à base de atropina 1% (Fagra® - 20 mL), colírio antimicrobiano de ciprofloxacina (Ciprovet Colirio® - 5 mL) e colírio antifúngico à base de cetoconazol 1% (manipulado), além de anti-inflamatório injetável intramuscular à base de flunexina meglumina (Banamine® - 50 mg - 1. 1 mg/kg SID) e um analgésico injetável intramuscular à base de dipirona sódica (Febrax® - 0,5 g - 15 mL/animal SID) até o dia da cirurgia, que foi marcada para 3 dias depois. A intervenção cirúrgica foi então instituída pela técnica de ceratectomia lamelar anterior, seguida de hidratação intraestromal com fluconazol e formação de retalho bipediculado, com o objetivo de remover o tecido necrótico e os fatores de estimulação antigênica, enquanto o retalho conjuntival visava melhorar a irrigação sanguínea e proteger a área lesionada, favorecendo a cicatrização local. Para melhor qualidade do pós-operatório do animal, foi prescrita a continuação do mesmo tratamento anterior à cirurgia por um período de 15 dias. O retorno do animal para a retirada do retalho estava previsto para 45 dias após a cirurgia, porém, devido à pandemia da COVID-19, houve um atraso de 135 dias. Quando o animal retornou, o retalho ainda estava estável. Foi instituída uma segunda cirurgia para a retirada do retalho, durante a qual foi possível afirmar que a córnea havia recuperado a integridade total e a transparência parcial com apenas um leucoma no local anterior do abscesso. Discussão: A técnica de ceratectomia lamelar anterior juntamente com o uso de um retalho de conjuntiva para o tratamento de abscesso estromal em equinos é uma técnica conhecida e utilizada rotineiramente, embora alguns casos relatem a formação de uma segunda infecção no mesmo espaço. No entanto, há poucos relatos sobre o uso de hidratação intraestromal com medicação antifúngica adjuvante à técnica cirúrgica, o que, conforme demonstrado neste relato, mostrou-se eficaz, pois mesmo com a questão do atraso na remoção do retalho conjuntival, o olho permaneceu íntegro e não houve uma segunda infecção. Portanto, o uso dessa técnica pode ser indicado para o tratamento de abscesso estromal em equinos, dada a segurança que a aplicação do antifúngico intratromal proporciona.
DOI:https://doi.org/10.56238/ciesaudesv1-082